Escrever a minha primeira linha de código foi como desbloquear um novo superpoder. No entanto, embora o software tenha registado melhorias significativas desde então continua a ser bastante limitado em muitos aspetos.
Nos próximos cinco anos, isso vai mudar por completo. Não será necessário utilizar várias aplicações para desempenhar tarefas distintas. Basta dizer ao seu equipamento, em linguagem corrente, o que quer fazer e ele fá-lo-á. Este tipo de software – algo que responde à linguagem corrente e pode realizar tarefas distintas com base no conhecimento que detém sobre o utilizador – chama-se agente. Mais especificamente, um agente de Inteligência Artificial (IA).
Agentes de IA: andar de um lado para o outro e fazer coisas
Os agentes de IA não são bots. Os agentes são mais inteligentes. São proativos, capazes de fazer sugestões antes mesmo de serem pedidas. Realizam tarefas em várias aplicações.
Além disso, evoluem com o tempo, porque têm registo das suas atividades e reconhecem o propósito e os padrões do seu comportamento. Com base nesta informação, oferecem-se para fornecer aquilo que consideram que o utilizador necessita, embora a decisão final seja sempre do utilizador.
Os agentes de IA terão um impacto significativo na democratização de serviços que atualmente são demasiado caros para a maioria das pessoas.
Terão ainda um grande impacto em várias áreas, nomeadamente: cuidados de saúde, educação, produtividade e entretenimento e retalho.
1. Cuidados de saúde
A IA desempenha atualmente um papel fundamental nos cuidados de saúde, nomeadamente nas tarefas administrativas. A verdadeira mudança vai ocorrer quando os agentes de IA puderem ajudar os pacientes a fazerem a triagem básica, a obter conselhos sobre como lidar com problemas de saúde e a decidir se precisam de procurar tratamento ou não. Ajudar os doentes e os profissionais de saúde será particularmente benéfico para as pessoas dos países mais empobrecidos, onde muitos não têm sequer a possibilidade de consultar um médico.
A saúde mental é outro campo no qual os agentes de IA se destacam. Ao partilhar informações suficientes com um agente de saúde mental, este pode compreender a sua história de vida e as suas relações. Com a sua autorização, é possível que o smartwatch monitorize as suas respostas físicas à terapia e sugira quando deve consultar um terapeuta humano.
2. Educação
O software não vai substituir os professores, mas sim complementar o seu trabalho, ao personalizar o trabalho dos estudantes e libertar os professores de papelada e outras tarefas adicionais, para que possam dedicar o seu tempo às questões mais importantes da sua profissão.
Se os agentes de IA conseguirem captar o que torna um professor mais eficiente, vão desbloquear instruções suplementares para todos os interessados. A experiência será assim enriquecida – com gráficos e sons, por exemplo – e personalizada, comparativamente aos docentes (com base em texto) atuais.
3. Produtividade
Já existem copilotos neste domínio que podem fazer muito, como por exemplo, transformar um documento escrito numa apresentação de diapositivos, responder a perguntas sobre uma folha de cálculo utilizando linguagem corrente ou resumir mensagens de e-mail expondo o ponto de vista de cada pessoa.
Mas os agentes de IA podem fazer ainda mais. Ter um será como ter alguém que se dedica a ajudá-lo em várias tarefas e a realizá-las de forma autónoma, se assim o desejar.
Se tiver uma ideia para um negócio, um agente de IA pode ajudá-lo a escrever um plano de negócios, a criar uma apresentação para o mesmo e até a gerar imagens do aspeto do seu produto.
Além disso, as empresas podem colocar à disposição do seu pessoal agentes de IA que podem ser consultados diretamente e participar em reuniões para esclarecer dúvidas.
4. Entretenimento e retalho
A IA já o pode ajudar a escolher uma televisão nova e recomendar filmes, livros, programas e podcasts.
Os agentes de IA não se limitam a fazer recomendações; ajudam-no a agir em conformidade com elas.
Se quiser comprar uma máquina fotográfica, o seu agente de IA tem capacidade de ler todas as críticas por si, resumi-las, fazer uma recomendação e encomendar a máquina assim que tome uma decisão. E se não souber o que lhe apetece, o agente pode fazer sugestões personalizadas e reproduzir o filme ou programa que escolher.
Agentes de IA como uma onda de choque na indústria tecnológica
Na indústria informática, referimo-nos às plataformas como as tecnologias onde são desenvolvidos aplicações e serviços. Android, iOS e Windows são plataformas. Os agentes de IA serão a próxima plataforma.
Para a criação de uma nova aplicação ou serviço deixam de ser necessários conhecimentos de código ou de design gráfico. Basta dizer ao seu agente de IA o que pretende e ele pode desenvolver o código, desenhar a aparência e experiência da aplicação, criar um logótipo e disponibilizar a aplicação numa loja online.
Os agentes de IA vão afetar a forma como utilizamos o software e como este é desenvolvido. Os motores de busca serão substituídos por eles, uma vez que serão mais eficazes a encontrar informação e a resumi-la para o utilizador.
Muitos sites de comércio eletrónico serão substituídos, porque os agentes de IA vão encontrar o melhor preço para o utilizador e não estarão limitados a apenas alguns fornecedores. Do mesmo modo, vão substituir também os processadores de texto, as folhas de cálculo e outras aplicações de produtividade. Áreas de negócio que atualmente estão separadas (como a publicidade de pesquisa, a publicidade nas redes sociais, as compras e o software de produtividade) vão fundir-se.
Os desafios técnicos que se colocam aos agentes de IA
Ainda ninguém sabe como será a estrutura de dados de um agente de IA. No entanto, atualmente existem novos métodos de armazenamento de dados (como as bases de dados vetoriais), que podem ser mais vantajosos para armazenar dados gerados pelos modelos de aprendizagem automática.
Outra questão que continua sem resposta é o número de agentes de IA com que as pessoas irão interagir ou como irão interagir com o seu agente.
Existem também outros desafios. Os agentes ainda não foram capazes de comunicar através de um protocolo padrão. O custo tem de baixar, para que os agentes possam ser acessíveis a todos. É também crucial evitar alucinações, especialmente em áreas como a saúde, onde a precisão é uma prioridade máxima.
Privacidade e outras grandes questões
À medida que tudo isto se conjuga, as questões da privacidade e segurança online tornam-se ainda mais urgentes do que já são.
A quem pertencem os dados que partilha com o seu agente de IA e como pode garantir que estão a ser utilizados de forma adequada? A polícia pode usar o seu agente de IA como prova contra si? Quando é que o seu agente de IA se vai reformular para fazer algo que pode ser prejudicial para si ou para outra pessoa? Quem escolhe os valores que são incorporados nos agentes?
Há também a questão da quantidade de informação que o agente deve partilhar. Não quer que o seu agente de IA partilhe os seus dados bancários ou registos clínicos com outros agentes, pessoas ou organizações.
Além disso outras questões podem afetar a forma como interagimos uns com os outros. Basta pensar no impacto de ter um agente de IA a tratar de algumas rotinas e/ou tarefas diárias que envolvem outras pessoas. É evidente que as interações sociais perdem a sua relevância.
Agentes de IA: foco no curto e médio prazo
A IA pode espelhar ou mesmo agravar os preconceitos existentes, mas também pode resolver os problemas que ela próprio cria, o que pode resultar num otimismo cauteloso para um maior desenvolvimento, em vez de uma pausa.
No futuro, os humanos poderão ser forçados a enfrentar questões profundas sobre o propósito dos agentes de IA. Imagine um cenário onde os agentes se tornam tão competentes que as pessoas já não necessitam de trabalhar tanto. Na eventualidade de tal acontecer, o que é que as pessoas fariam com o seu tempo? Valerá a pena estudar quando um agente tem todas as respostas? É possível ter uma sociedade segura e próspera quando os indivíduos têm tanto tempo livre?
Embora ainda não tenhamos chegado a esse ponto, os agentes de IA estão aqui e, nos próximos anos, vão alterar completamente a forma como vivemos as nossas vidas, tanto online como offline.
Luís Tunes
Cientista de Dados